Biografia de Göbbels Voltar à página anterior

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Hitler é o criador de um mito do qual ele próprio depende, tal como todos os ditadores com as suas cortes. A partir do momento em que encontra a sua figura de culto, o Dr. Joseph Goebbels, sente-se chamado. Hitler é o seu messias.

"6 de Novembro de 1925. E aqueles olhos azuis parecem estrelas. Mostra-se contente por me ver, sou um homem feliz. Aperta-me a mão. depois fala durante uma meia-hora com um espírito de ironia, humor, sarcasmo, gravidade, veemência, paixão! Este homem tem tudo para ser Rei, nasceu para ser o tributo do povo, o futuro ditador" (Diário de Goebbels).

É a nostalgia do homem forte: "Para nós, alemães, as suas palavras, os seus desejos são ordens"; "Os colaboradores mais próximos do Führer olham-no e encontram no seu rosto força e confiança"; "Um homem de excepcional grandeza..."(Discursos radiofónicos).

Um homem assim precisa de um tambor que o siga cegamente. "Creio que Hitler prezava muito Goebbels como apoiante fiel, como nacional-socialista indefectível e como um competentíssimo ministro da Propaganda. Mas nunca detectei qualquer sinal de amizade ou sequer de cordialidade na sua relação com ele" (Traudl Junge). Quando o pequeno Doutor é atormentado pelo receio de que os seus rivais roubem o favor do seu ídolo, basta um pequeno elogio, uma paternal palmadinha nas costas para que de novo se sinta feliz. "Acima de tudo, porém, devo agradecer-lhe o ter recebido das minhas mãos, há dez anos, uma bandeira que implantou na capital do Reich e que transformou no estandarte da Nação!" (Discurso de Hitler).

Em Novembro de 1926, Hitler enviou o escritor falhado para a toca do leão. Na vermelha Berlim, onde o partido vive na sombra, o governador de distrito (Gaulleiter) Goebbels tem como missão a conquista do poder. Goebbels vê chegada a oportunidade da sua vida. Com a sua ambição, argúcia e falta de escrúpulos, mete mãos à obra. 0 que pretende, acima de tudo, é dar nas vistas. "Os gestos eram os de um tribuno do povo. 0 corpo franzino, de baixa estatura, uma cabeça desproporcionalmente grande e uma boca estranhíssima, uma boca que rasgava o rosto. E o que me impressionou nele, na altura, foi que ele já então tinha algo de marionete'' (Stéphane Roussel, jornalista).

Como candidato Goebbels vai direito ao assunto mas como orador a sua imagem resulta um pouco inábil. "Um povo inteiro cai em desespero. Se não fôssemos nós, não haveria esperança para a Alemanha!" (Discurso de Goebbels como Gaulleiter). 0 seu jornal de campanha tem o título sugestivo de "Angriff" (Ataque). "0 «Angriff» daquela época era absolutamente execrável. As mentiras que eles inventavam... Mas parte do povo acreditou e Goebbels conseguiu assim conquistar grande parte da pequena burguesia e até do chamado proletariado. Goebbels percebeu que podia conquistar o poder nas ruas utilizando a arma do terror" (Fritz Marcuse).


Com cabeçalhos, ameaças, atracções, propaganda e pela força. Os feridos e os mortos são particularmente úteis ao governador de distrito. Os mártires são muito eficazes. 0 culto dos mortos como arma de propaganda... é aqui que tudo começa e Goebbels vai servir de exemplo para outros notáveis do partido mais tarde. "Os alemães talvez não entendam a vida mas sabem morrer como ninguém!" (Discurso funerário).


"Participei em vários desses funerais, incluindo o de Horst Wessel, cuja morte é um exemplo paradigmático de como a propaganda pode transformar um acontecimento. Ele pintou Wessel como filho de um pároco, um estudante honesto, um idealista que lutou pela cruz gamada, que compôs um hino para os seus companheiros, etc. Criou o mito de Horst Wessel e sustentou-o até ao fim" (Fritz Hippler). A República de Weimar afunda-se à cadência desse hino. "A partir de 1933, esse hino transformou-se, na Alemanha, num, hino sagrado ao qual se devia demonstrar veneração. Quem não erguesse o braço era insultado, se um judeu erguesse um braço era insultado a dobrar. Era uma situação delicada, tal como com a bandeira" (Sr. Hamburguer). 0 incendiário atiça o fogo com que os "homens de bem", vestidos de castanho, incendeiam a Alemanha.


"Conhecíamos as fogueiras das gravuras dos livros de história, da Idade Média. Na nossa época eram algo de inesperado. E à luz dessas chamas o rosto de Goebbels foi-se sempre transformando e não para melhor. Sempre teve algo de desumano. Pensando em Goebbels interrogava-me: quem era ele? Um jornalista que nunca encontrou o caminho certo? Um autor cujos livros não tiveram aceitação? E como jornalista pensava: terá acontecido muitas vezes na história mundial que um jornalista frustrado, um escritor falhado, tenha tido a oportunidade de queimar os livros dos seus rivais? Foi um triunfo para o pequeno Dr. Ele queria incitar ao ódio, acreditava no ódio. Até nas relações pessoais. Goebbels não gostava dos seus semelhantes" (Stéphane Roussel). E odeia especialmente os judeus. Agora que tem poder irá vingar-se. Os judeus são os bodes expiatórios dos longos anos de frustração.


"0 boicote teve início às dez horas. Está a ser cumprido com um ímpeto inesperado mas também com extraordinária disciplina" (anúncio do início da segregação anti-semita feito por Goebbels). 0 poder de Goebbels contra as lojas dos judeus. A marcação das lojas e dos próprios judeus deixam antever a ameaça que pende sobre as pessoas se o ódio racial se tornar lei. Aos alemães o regime mostra-se em tons luminosos e Goebbels encena a tomada do poder para o cinema.


A fachada de tudo isto é o seu novo Ministério da Propaganda, o posto de comando da lavagem ao cérebro e da sedução do povo. A partir deste centro uma campanha publicitária sem par conquista um país e um povo. Os meios são modernos, a mensagem é bárbara. É a ditadura de opinião.


"É esse o segredo da propaganda: atingir aqueles que a propaganda quer atingir, intoxicá-los com as ideias veiculadas sem que eles o notem. Claro que a propaganda tem um objectivo, mas esse objectivo tem de ser tão bem camuflado que aqueles que o devem absorver não se apercebam de nada" (Discurso de Goebbels). A obediência dos ajudantes, que o patrão da imprensa promove a chefes de fila, é canina. "Eu sentia-me relativamente livre. Sempre achei que podia escrever o que quisesse. Passados poucos anos, porém, ao ler artigos da época, surpreendeu-me o estilo constrangido em que estavam escritos. Era como se estivéssemos em sentido, aguardando ordens"(Hans Borgelt, jornalista).


"Mas nós, prevendo o futuro, disciplinámos de tal forma o jornalismo alemão que não era necessário dar ordens. Bastava um leve aceno para que a imprensa percebesse que não havia discussão. Resultado: arautos servis da ditadura. 0 primeiro dever de um jornalista era a obediência por antecipação como nesta entrevista a Goebbels: "Porque motivo se vai proceder a um novo referendo? Toda a gente sabe que o povo alemão apoia o governo nacional-socialista".


0 poder das imagens é o instrumento mais eficaz. Daí resultam quilómetros de filme de propaganda. É esse o verdadeiro legado de Goebbels: imagens concebidas para enfeitiçar um povo. Multidões, Nação, culto, ordem num mundo caótico é o que, infelizmente, prometiam essas imagens.


As paradas não passavam de uma missa solene para o sumo-sacerdote (Hitler), tão dependente do culto em torno de si como o seu criador, Goebbels. 0 III Reich como uma festa permanente. Os adereços, o cenário e o mestre-de-cerímónias (Hitler). 0 homem que fazia a opinião observava atentamente, nessas ocasiões, o comportamento do povo. É a sua versão de sondagem. A ligação às bases do partido é um dos segredos do ofício e Goebbels pratica o hábito de estar em contacto com as bases com frequência nas várias reuniões das células do partido.


No respeitante ao número de filhos, o ministro não tem do que se envergonhar. A cota de nascimentos é diligentemente preenchida com 4 filhas e 1 filho. Um quadro familiar ídilico sempre transmitido ao povo. 0 pequeno homem chegou longe e quer que todos o saibam. Era a família modelo do III Reich A senhora Goebbels provém de uma excelente família. Um bom partido e uma nacional-socialista acérrima. Era um casal ao gosto de Hitler.


Um marido exemplar. Prestigíado por esta mulher, Magda Goebbels, dá-se ares mundanos e desfruta as benesses do seu poder. Adquire os símbolos do estatuto social dos anos 30, entre outros, um iate que ele próprio afirma ter sido um pouco caro. 0 bon-vivant gosta de ir a Itália. No país do Duce, o seu modelo, Goebbels, pode representar o Reich. Como gostaria de ser ministro dos Negócios Estrangeiros! Na Alemanha aceita uma quinta que lhe é oferecida pela cidade de Berlim. A casa é paga pela UFA mas não se trata de corrupção... é apenas uma homenagem. A casa de campo da família é um lar... sem pai. 0 serviço público está primeiro. Não obstante, nada parece perturbar a alegria familiar. "Ele adorava os filhos e os filhos adoravam-no. Tinha muito jeito para brincar com eles. Era uma família perfeita".


Mas os valores familiares do marido ideal desvanecem-se frequentemente à vista de outras saias. Goebbels não seria GoebbeIs se não encontrasse palavras sublimes para se justificar: "Não somos moralistas mas homens do Renascimento e queremos demonstrá-lo também na vida pública" (Discurso).


Nesta tarefa não encontrava entraves. Como senhor absoluto do cinema alemão utiliza frequentemente esta posição para se insinuar junto das actrizes. Papeis a troco de favores sexuais, o jogo é sempre o mesmo. "E então disse que tinha sido óptimo poder descontrair-se um pouco e que eu era uma companhia encantadora. Eu não tinha feito nada para isso pois estava demasiado assustada. Que gostava de passear pelos arredores, se lhe fazia companhia... que podia eu fazer? Demos umas voltas pela cidade e depois metemos pela auto-estrada. Fomos dar a um bosque, a um sítio onde havia uma cerca. Entrámos. Havia uma pequena casa, um pequeno bungalow, numa colina, junto de um lago. Alguém abriu a porta. Ele acendeu a lareira, ou outra pessoa, já não sei, perguntou se queria tomar alguma coisa, conversámos, conversámos... e depois tentou assediar-me.


Aquilo repugnou-me de tal forma que não pensei na minha carreira. Ele prometeu-me mundos e fundos mas eu reagi de tal maneira que ele desistiu. Então disse-me «Assim nunca fará carreira!». Disse-mo textualmente. Isto foi numa Sexta-feira. No Domingo à noite ou na Segunda-feira, já não sei bem, quando nos preparávamos para retomar as filmagens, telefonaram-nos a dizer que o filme tinha sido cancelado" (Anneliese Uhlig, actriz de cinema). Quem se opunha à sua vontade era afastado.


Na infância, uma doença da medula provocara-lhe uma deformação do pé direito. Excluído do mundo dos aptos, odeia, acima de tudo, "os canalhas". Sem dúvida que a deformidade física influenciou o seu carácter, daí o rancor, a sede de vingança que, obviamente o consumiam. Não conseguia esquecer, foi algo que sempre o acompanhou. Em resumo, desenvolveu traços negativos que remontam, na minha opinião, à sua infância. A sua relação com as mulheres também foi muito influenciada por esses traumas de infância que marcaram a sua personalidade" (Wilfried von Oven).


Com Lida Baarova, a escorregadela transforma-se num caso com consequências mais sérias. "Eu apaixoneí-me pelo seu amor. Ele amava-me tanto que me deixei seduzir pelo amor. Infelizmente resolveu contar tudo à mulher. No dia seguinte ela foi ter com Hitler e contou-lhe uma história totalmente diferente. Disse-lhe que eu me intrometera no seu casamento o que era mentira. Hitler mandou chamar Goebbels e exigiu-lhe que se comprometesse a acabar tudo.


Hitler chamou-os a Obersalzberg. Magda estava tão farta que queria o divórcio. Goebbels queria demitir-se e ir para o Japão como cônsul e disse «pouco me importa se tiver de ir vender gravatas para o Japão. Quero a demissão». Hitler enfureceu-se e fez uma cena terrível. Precisava de Goebbels e não podia admitir aquilo. Teve um ataque de fúria e depois disse «muito bem, tentem viver juntos durante três meses. Se, passado esse tempo, me disserem que é impossível concedo-vos o divórcio». É claro que não tencionava fazê-lo, queria apenas ganhar tempo" (Lida Baarova, amante de Goebbels).


Desta vez, Goebbels tem uma recepção gelada em Obersalzberg. Hitler vê no escândalo sobretudo um factor de perturbação. Em plena crise dos Sudetas, um caso de amor com uma checa não se enquadra nos seus planos. Apavorado, o galã curva-se perante a vontade do seu amo, cujo favor lhe é mais caro que qualquer mulher. "Hitler, em tom gélido, deu-lhe 48 horas para fazer regressar Lida Baarova a Praga. Assim aconteceu. A partir de então para alegria dos seus inimigos, Ribbentrop e outros, Goebbels caiu em desgraça. Foi terrível para ele deixar de ser convidado, como era habitual, para a Chancelaria e ter sido posto de parte pelo Führer e pude ver, nessa fase como ele dependia disso. Como um alcóolico depende da garrafa ansiava por um trago, ansiava por receber de novo um convite caloroso do Führer" (Reinhard Spitzy, assessor de Ribbentrop).


Até que, em Novembro de 1938, surge uma oportunidade inesperada. Quando velhos combatentes evocam, uma vez mais, nas ruas de Munique, o putsch falhado de Hitler, chega a notícia de que um diplomata alemão terá sido assassinado em Paris por um judeu. "Goebbels pressentiu a sua oportunidade de se fazer lembrado e notado pelo seu soberano e convocou o antigo corpo SA de Berlim (agora incorporado na Wermacht), com o qual tinha conquistado a cidade e deu-lhe liberdade de acção. Queria demonstrar que ele era o indefectível, o mais leal, e soltou aquela gente, a populaça contra os judeus, contra as lojas dos judeus" (Reinhard Spitzy).

"10 de Novembro de 1938. Fui à recepção do partido na antiga câmara municipal. Grande movimento. Expus a situação ao Führer. Ele decidiu deixar prosseguir as manifestações e retirar a polícia. Os judeus devem experimentar a ira do povo. Tem razão. Dei imediatamente instruções à polícia e ao partido em conformidade. Depois fiz um pequeno discurso sobre o assunto perante a direcção do partido. Aplausos estrondosos! A notícia correu célere por telefone. Chegou a hora de o povo agir. Quando me preparava para ir para o hotel vi um clarão vermelho no céu: a sinagoga estava a arder. Apenas se evitará que o fogo se propague aos edifícios contíguos. De resto, deixár-se-à arder. A caminho do hotel ouvia o estilhaçar dos vidros. Bravo! Bravo!" (Diário de Goebbels).

A patente da encenação da ira popular é sua. Com esta bárbara acção oferece os seus préstimos como o mais radical dos anti-semítas. "Creio que, tanto Hitler como Goebbels, estavam convencidos de que existia uma conspiração judia à escala mundial. Os judeus eram uma parte da população a aniquilar. Creio que isso ficou claro desde o primeiro momento. Ele disse expressamente que seria declarada guerra aos judeus, que eles faziam mal em não levar a ameaça a sério.

Num dos seus discursos Goebbels afirmou «a imprensa judia ri-se de nós. Pois eu digo-vos, chegará o dia em que os judeus perderão a vontade de rir». Estaria já a pensar em Buchenwald e Auschwitz? Não sei" (Stéphane Roussel).

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