Perfil Cronológico da História Japonesa
Parte I -
(Do período Jomon ao final do shogunato de Kamakura) Voltar à página anterior


Por Bito Masahide, Ph.D. (professor de História Japonesa na Universidade de Chiba e Professor Emérito da Universidade de Tokyo) e Watanabe Akio, Ph.D. (Professor de Relações Internacionais da Universidade de Tokyo).

Agradecimentos: Embaixada do Japão em Portugal, ISEI (International Society for Educational Information, Inc. -Tokyo)


1. Da Idade Primitiva ao Século VI depois de Cristo

1.1. Período Jomon

O arquipélago japonês foi habitado pela primeira vez há mais de 100.000 anos atrás, quando ainda era uma parte da massa de terra do continente asiático. O homem e muitas espécies de animais, incluindo uma extinta variedade de elefante, viveram aqui. Fósseis humanos e instrumentos de pedras desenterrados de camadas daquela época revelam como este povo antigo viveu caçando e colhendo na idade da pedra lascada (período Paleolítico).

Jarra JomonNo Neolítico, há aproximadamente 10.000 anos atrás, iniciou-se o fabrico de utensílios de pedra refinados, o desenvolvimento de técnicas de caça avançadas com recurso a arcos e flechas, e a produção de recipientes de barro para cozinhar e guardar alimentos. Esses recipientes de barro são chamados de cerâmica "jomon" (marcados com corda) devido ao seu estilo de decoração e, por isso, este período é chamado de Período Jomon (por volta de 8.000 a 300 a.C.).

1.2. Período Yayoi

A partir de 300 a.C., foram introduzidas a agricultura (centrada no cultivo do arroz) e as técnicas de trabalhar os metais no continente asiático. Dos produtos metálicos eram usadas espadas de bronze e espelhos para rituais religiosos. Entretanto, as armas de ferro e instrumentos agrícolas eram já usados na vida diária aumentando a produção agrícola. A divisão de trabalhos deu origem e ampliou a diferença entre as classes governante e dominada causando com o tempo a formação de pequenos Estados em muitas partes do antigo Japão. Esta Era (300 a.C. a 300 d.C.) é chamada de Período Yayoi por causa do nome da técnica de cerâmica usada nessa época.

1.3. Século IV a VI d.C.

Os pequenos Estados que haviam surgido foram gradualmente unificados e por volta do século IV d.C., foram governados por fortes autoridades políticas estabelecidas e centradas em Yamato (actual município de Nara). A actual família imperial japonesa depende desta linhagem de governadores centrais. Túmulos imensos contruídos na área perto de Yamato durante o século V têm áreas de base tão amplas como as das pirâmides do Egipto o que reflecte bem a extensão do poder dos governantes da altura. Neste período (entre os séculos IV e VI da nossa Era) verificaram-se grandes desenvolvimentos na agricultura e a introdução da cultura chinesa, incluindo o Confucionismo (através da Coreia). Foi durante esses séculos que os japoneses se familiarizaram com a escrita chinesa.

2. Formação e Desenvolvimento do Estado Antigo: Os Períodos Asuka, Nara e Heian (593-1192)

2.1. Período Asuka

Templo Horyu-ji, construído por volta de 607. A sua construção representa o estilo arquitectónico do período Asuka. Património mundial da humanidade. Mais antiga estrutura de madeira conhecida.A adopção do termo "imperador" (tenno) pelos governantes do governo central remonta ao início do século VII. O Príncipe Shotoku, que então governava por sua tia a Imperatriz Suiko, restringiu o poder das grandes famílias (antigos barões locais suficientemente fortes para se haverem oposto em algumas ocasiões ao governo central) e decretou uma série de normas conhecidas como "Constituição dos Dezassete Artigos" para fortalecer a unificação do estado.
Também enviou emissários à corte Sui, na China, num esforço para estabelecer relações diplomáticas de Estado para Estado numa nova tentativa de reforçar a unificação do Japão. O templo Horyu-ji, a estrutura existente de madeira mais antiga do mundo e as imagens budistas que estão nele guardadas, foram feitos neste período (entre 593 e 628) sendo um conjunto famoso pela sua beleza artística. Esta Era é conhecida como período Asuka.

2.2. Período Nara

A organização centralizada do Estado, proposta pelo Príncipe Shotoku, reflectiu-se novamente nas reformas políticas Taika de 645. Esta reforma política foi firmemente estabelecida através dos códigos da lei Taiho, emitidos em 701. Como consequência deste código toda a terra e população ficaram sob a jurisdição do governo central. As poderosas famílias locais, privadas dos seus antigos privilégios, adquiriram um novo estatuto como aristocratas - isto é, um alto escalão de burocratas - no caso da classe superior, enquanto que as classes inferiores da antiga elite obtiveram posições como oficiais locais. Preparou-se um censo nacional seguindo-se uma distribuição de terras aos camponeses com os respectivos tributos em impostos e trabalho. Este sistema foi modelado seguindo o sistema burocrático da dinastia Tang da China.

Em 710, contruiu-se uma grande cidade em Nara seguindo o modelo de Chang'an, a capital de Tang (actual Xian). O Período Nara (710-787) marca o pico do poder do Estado burocrático de estilo continental. Durante esta Era, o budismo prosperou graças ao apoio do governo e foram apoiadas as criações de arquitectura de templos e esculturas. O "Man'yoshu", a mais antiga colecção de poemas japoneses também foi compilada neste período.

O sistema sócio-político importado, no entanto, não se adaptou à sociedade japonesa por diversos motivos e a política do Estado seria desfeita várias vezes pelos monges budistas. Numa tentativa de escapar ao ambiente de instabilidade que se estava a criar o governo mudou a sua capital para Heian-kyo (actual Kyoto).

2.3. Período Heian

No Período Heian (794-1192), o estilo chinês de organização e administração do Estado foi modificado para se adaptar às necessidades específicas japonesas e rapidamente se desenvolveu uma sofisticada cultura nativa. O clã Fujiwara, que tinha tido um papel preponderante na execução das reformas Taika aumentou o seu poder entre os escalões mais altos do governo. Várias gerações de Fujiwaras estabeleceram fortes laços matrimoniais com a família imperial e o chefe deste clã adquiriu uma posição onde podia, de facto, exercer muitos dos poderes do imperador enquanto outros membros do mesmo clã monopolizavam a maioria dos cargos de responsabilidade do Estado. Também as funções oficiais de médio e baixo nível se tornaram monopólio hereditário de certas famílias aristocráticas.

Paralelamente ao estabelecimento deste sistema de estatuto social rígido, o budismo tornava-se mais esotérico e os aristocratas começavam a buscar a salvação através de cerimónias e rituais místicos. Estava assim criada uma nova cultura cujo centro era a corte real. A invenção do Kana (escrita silábica desenvolvida a partir dos ideogramas chineses para as expressões fonéticas da linguagem japonesa) ajudou a proporcionar uma base para a verdadeira literatura vernácula que apareceu mais tarde neste período. "O Conto de Genji" (Genji Monogatari) pela senhora Murasaki, que é um exemplo magistral deste género de literatura, é considerado a primeira novela do mundo.

Nas províncias, entretanto, o sistema público de possessão das terras estava prestes a sucumbir e foram então criadas terras de domínio privado (shoen) em muitas zonas do Japão. A posse privada de novas terras já tinha precedente no Período Nara. No Período Heian, as poderosas famílias aristocratas e um grande número de templos tomaram a liderança em abrir e colonizar novas regiões de terras aráveis. Por volta do século X, os registros de famílias e a distribuição de terras agrícolas foram interrompidos e as terras de propriedade do Estado foram integradas nas propriedades privadas. Os poderosos aristocratas e os monges de importantes templos (uma vez que também eles eram importantes proprietários) designaram as principais famílias locais e os camponeses como administradores, fortalecendo bastante o poder destes últimos. A expansão de propriedades privadas reduziu gradualmente os rendimentos estatais e a família imperial foi forçada a contar com a propriedade privada para o seu rendimento.

A execução regular da administração local tornou-se mais difícil causando um colapso na ordem e leis públicas. As famílias provinciais ricas e poderosas fortaleceram os seus poderes militares com espadachins, arqueiros e cavaleiros e recrutaram os camponeses locais como seus seguidores. Foram estes desenvolvimentos que levaram ao nascimento da classe do Samurai (guerreiro). Alguns aristocratas, incapazes de adquirir altas posições no governo central deslocaram-se para a província onde assumiram a liderança dos samurais locais.

Eventualmente, dois clãs aristocratas, os Genji (clã Minamoto) e Heike (clã Taira) - ambos descendentes da família imperial - tornaram-se os representantes dos dois maiores grupos de samurais. Na capital, por sua vez, as famílias aristocratastinham samurais para guardar as suas mansões/palácios enquanto que os grandes templos eram guardados pelos próprios monges armados.

No final do século XI, a família imperial procurou restaurar o seu poder político que estava posto em causa devido a estas alterações sociais e devido ao clã Fujiwara. Em consequência disso e desde 1086, alguns imperadores abdicaram e retiraram-se para mosteiros de onde tentaram aumentar e estender as suas autoridades sobre os assuntos governamentais. Entretanto, este modelo político instável e irregular, conhecido como "Regime dos Imperadores Enclausurados" levou a muitos conflitos entre o imperador de facto e o imperador retirado durante toda a metade do século XII. Estes conflitos chegaram mesmo a degenerar em conflitos armados na cidade de Kyoto como, por exemplo, a Guerra Hogen (de 1156) e a Guerra Heiji (de 1159). estas guerras tiveram como resultado um reforço ainda maior da classe dos samurais. Havia sido dado início aos Shogunatos. Embora o poder político tenha sido capturado uma primeira vez pelo clã Heike, estes foram logo de seguida derrotados militarmente pelo clã Genji.

3. Formação do Governo Samurai: O Período Kamakura (1192 - 1333)

Como outras famílias aristocratas, o clã Heike ocupou as posições oficiais mais altas do governo central. Minamoto no Yoritomo, que destruiu o clã Heike, mudou a sua base administrativa para Kamakura, uma vila litoral no leste do Japão, e organizou uma forma de governo baseado nas regras dos samurais. O seu regime ficou conhecido como Shogunato de Kamakura. Yoritomo foi nomeado shogun (general) pelo imperador e a corte também lhe concedeu a autoridade para nomear os seus próprios vassalos como, por exemplo, protectores provinciais (shugo) e administradores (jito) responsáveis por administrar as propriedades privadas. Este desenvolvimento provocou o fortalecimento de um sistema político claramente feudal. Ao mesmo tempo, os oficiais provinciais ainda eram nomeados pela corte imperial e os administradores de propriedades privadas pelos proprietários. Assim, a estrutura política do Período Kamakura foi dualista: devido à existência da corte imperial e do shogunato de forma simultânea e independente.

Pintura do período Genji onde o shogun recebe as suas visitas.A linhagem do shogun Genji terminou após três gerações. Depois disso coube ao clã Hojo desempenhar o papel dominante dentro do shogunato. O clão Hojo redigiu o Código Joei, que codificou as práticas legais e de costumes do samurai, ganhando assim a confiança e o apoio da classe samurai (a classe guerreira/militar). Este seria de vital importância para a sobrevivência do Japão enquanto Estado pois durante este período o exército mongol de Kublai Khan invadiu Kyushu por duas vezes (em 1274 e 1281) tentando conquistar o Japão. Sob a direcção do governo os samurais conseguiram repelir os ataques ajudados pela metereologia, uma vez que tufões assediaram a frota mongol. Estes tufões ficaram conhecidos mais tarde como kamikaze (tempestade divina).

No entanto, o shogunato não foi capaz de recompensar adequadamente aqueles que haviam lutado contra os mongóis. Para além disso, o clã Hojo ocupava agora todas as posições oficiais importantes do shogunato condunzindo os assuntos administrativos de forma arbitrária e autoritária. devido a estes dois factos, o shogunato em breve perderia a confiança dos samurais.

As últimas décadas do Período Heian e do Período Kamakura doram marcadas por muitos desenvolvimentos religiosos novos. Introduziram-se e criaram-se novas formas de crenças budistas que, devido à sua maior simplicidade e menor ênfase em rituais, se expandiram rapidamente entre os samurais e população em geral. Foi durante estes dois períodos que surgiram algumas seitas importantes das quais se destacam o Jodo, Jodo Shin, Zen e Nichiren